Dois especialistas internacionais
analisaram no começo da manhã desta terça-feira, dia 18 de
julho, como os países tropicais conseguiram impulsionar a
produção e aumentar a produtividade de cereais nos últimos 30
anos. Kevin Pixley, diretor do
Centro Internacional de Melhoramento de Milho e Trigo
(CIMMYT-México), e Antônio Fernandino de Castro Bahia Filho,
reitor da Fundação Educacional Monsenhor Messias e
ex-pesquisador da Empresa
Brasileira de Pesquisa Agropecuária, participaram da
primeira sessão paralela do Workshop Internacional sobre
Desenvolvimento da Agricultura Tropical (IWTAD), que está
ocorrendo em Brasília nesta semana.
O Workshop é promovido pela
Embrapa, pelo Banco Mundial e pelo
Grupo Consultivo em Pesquisa
Agrícola Internacional (CGIAR). E tem como objetivo discutir
pela primeira vez as bases do sucesso da agricultura tropical e
porque ela deu tão certo em países como o Brasil e não se
desenvolveu em outros pontos, como África e muitos países da
América Latina.
O caso do milho
Pixley começou relembrando que
houve um aumento crescente na produção de milho nos países em
desenvolvimento nas últimas décadas, mas o mesmo não aconteceu
nos países subdesenvolvidos. O motivo? A adoção de tecnologias
modernas, principalmente de cultivares de milho híbrido,
mecanização das lavouras, correção de solos e participação do
setor privado. "E isso levando em consideração que nos países em
desenvolvimento dos trópicos, menos da metade está utilizando
tecnologias inovadoras", afirma ele.
O diretor do CIMMYT apontou dois principais fatores que provocam
perdas nas produção de milho hoje em todo o mundo: estiagens
longas e a deficiência de Nitrogênio - este último presente em
quase todos os países africanos. A solução, segundo ele, passa
necessariamente pela inovação científica, com o desenvolvimento
de novas tecnologias de tolerância à seca (híbridos, técnicas de
manejo etc) e a utilização de adubos e fertilizantes para
correção de solo. "O Brasil fez isso também para coorigir a
presença de alumínio nos solos do Cerrado", exemplificou. Já na
África, os produtores utilizam muito pouco fertilizantes
químicos para solucionar a deficiência de Nitrogênio.
Kevin Pixley também ressaltou outras experiências de sucesso com
milho na faixa tropical. "A pesquisa participativa, base para a
inovação científica moderna, traz para o método científico a
participação direta do produtor. Isso aconteceu no Nepal na
última década, onde a pesquisa agropecuária teve que levar em
conta a utilização de partes do milho até então desprezadas em
outros países, como a folha da planta. Os produtores
necessitavam de folhas maiores, para serem usadas pelas
famílias", lembrou.
Ele também mostrou que a interação do plantio direto com
variedades tolerantes à seca ou com a fixação biológica do
nitrogênio era um exemplo a ser seguido, bem como tecnologias
inovadoras na área da biométrica. E por fim tocou na
biotecnologia: "nosso maior desafio agora é fazer com que a
biotecnoligia chegue aos pequenos produtores também. Até agora
nós não conseguimos isso".
Milho, arroz e trigo no Brasil
Entre 1990 e 2004, a produção
de milho, arroz e trigo cresceu, no Brasil, em torno de 67%, 27%
e 71% - no caso do milho e do arroz, houve também redução da
área plantada, enquanto que no trigo a expansão da área superou
os 12%. O que levou o país a obter esses números? Antônio
Fernandino de Castro Bahia Filho defende algumas respostas, como
os expressivos incrementos na produtividade agrícola das
lavouras, com a geração e adoção de tecnologias, assistência
técnica, crédito, envolvimento do setor privado no processo de
transferência (como a indústria de sementes, de fertilizantes e
de máquinas, principalmente semeadoras), a migração de
agricultores do Sul, a integração da Pesquisa & Desenvolvimento
com a política governamental e a criação da Embrapa e do Sistema
Nacional de Pesquisa Agropecuária (SNPA).
"Registramos nas duas últimas safras um aumento da produtividade
de milho, acompanhado de duas novidades: a redução da área na
safra principal e uma segunda safra anual superior à primeira",
anunciou Bahia.
Em seguida o pesquisador, apontou os principais impactos da
pesquisa agropecuária brasileira nas três culturas de cereais
analisadas: milho, arroz e trigo. "Tudo começou nas décadas de
70 e 80, com a introdução e adaptação dos materiais do CIMMYT.
Depois vieram as cultivares da Embrapa, criadas especificamente
para as características brasileiras", relembrou ele, citando
três casos de maior sucesso, que foram a BR 106 (cultivar
plantada até hoje no território nacional), a BR 201 (primeiro
híbrido da Embrapa e que marcou a decisão estratégica da Empresa
de entrar nesse mercado) e a BR 1010 (já fazendo parte da nova
geração de híbridos simples com tolerância a estresses
múltiplos).
No caso do arroz, Bahia destacou o que ele chamou de a maior
inovação: sair da adaptação do tradicional arroz japônico,
utilizado na década de 70, para o arroz moderno brasileiro, com
a utilização de germoplasma originário do CIAT, do CIRAD, da
USDA e da própria Embrapa para introdução de características,
como grão fino longo. Essa mudança estabeleceu um novo patamar
de competitividade do arroz brasileiro no mercado.
No trigo, a pesquisa brasileira atuou, na opinião de Fernandino,
principalmente na redução do porte da planta, na adaptação e
desenvolvimento de novas cultivares mais tolerantes à seca e
resistente a doenças, nos ganhos de produtividade e na maior
força do glúten. "Foram anos e anos de melhoramento com um olho
no rendimento, outro no acamamento e outro na tolerância a
doenças".
Bahia mostrou que depois da Embrapa modificar sua política de
propriedade intelectual, suas cultivares de arroz chegaram a
ocupar 41% do mercado nacional; as de milho, 45%; e as de trigo,
46%.
No final, ele lançou algumas preocupações para o setor de
cereais no Brasil. "Primeiro, a limitação de recursos e
manutenção do melhoramento genético. Isso pode ameaçar a nossa
soberania, já que muitos programas não podem ser compartilhados,
tem que ficar na mão do setor público brasileiro. Segundo, o
sucateamento de grande parte dos nossos laboratórios. Terceiro:
a biotecnologia que deverá estar focada em projetos que possam
liberar produtos, que possam chegar aos mercados. Depois, a
sustentabilidade e a preocupação com os impactos ambientais,
principalmente no que se refere à agua e ao aquecimento global.
Quinto, o estabelecimento de um novo modelo de parceria
público-privada, sem enfraquecer o nosso papel de setor público.
E por fim, uma agenda social calcada na boa ciência", finalizou.