Brazil
July 19, 2006
Na tarde
do dia 18, especialistas em algodão, cana-de-açúcar e florestas
cultivadas fizeram uma avaliação evolutiva do cenário das
cadeias produtivas e revelaram perspectivas futuras na área.
Essa foi a temática do painel “Impulsionando a produtividade e a
produção agrícola: fibras e energia”, do Workshop Internacional
sobre Desenvolvimento da Agricultura Tropical (IWTAD), que
ocorre em Brasília/DF nesta semana.
O presidente da sessão foi Lineu Carlos da Costa Lima,
secretário de Produção e Energia, do Ministério da Agricultura,
Pecuária e Abastecimento (Mapa).
Algodão
O
primeiro caso apresentado foi o do algodão. Eleusio Curvelo
Freire, diretor da Cotton Consultoria e ex-pesquisador da
Embrapa Algodão, comentou sobre os 35 anos de mudanças na
produção do algodão, nas quais o setor passou por quatro
grandes crises.
De acordo com ele, no final do século XX, na década de 80,
foram plantados no Brasil 4,1 milhões de hectares de
algodão, sendo 3,2 milhões de algodoeiros arbóreos no
Nordeste. Neste período, o sistema de exploração que
predominava era o familiar ou em parceria. A mecanização
ocorria em poucas etapas do cultivo, quase não se utilizavam
insumos modernos e a produtividade era baixa. Outra
característica da cadeia na época é a de que a agricultura
empresarial ocorria apenas nas regiões Sul e Sudeste.
Foi neste período também que surgiu a praga “bicudo do
algodoeiro”, mais exatamente em 1983, nos Estados da Paraíba
e São Paulo, expandindo rapidamente para outros lugares.
Isso provocou mudanças no trabalho de melhoramento e fez com
que mais uma crise se instalasse no setor. A mudança na
política de crédito rural, que dificultou o acesso de
pequenos produtores, contribuiu para o alastramento do
problema. “Os pequenos produtores não tinham capacidade
técnica e econômica para conviver com o bicudo e isso os
prejudicou muito”, comentou Eleusio. Também fizeram parte do
pacote da crise neste período as intervenções
governamentais, que restringiram as exportações e a redução
da alíquota de importação de 55% para 10% (em 1988) e para
0% (em 1991), além do câmbio defasado, que favoreceu a
importação de grandes volumes de algodão, a prazos longos.
As conseqüências da crise foram diversas, mas as mais
evidentes foram a perda de um milhão de empregados na
lavoura, o fechamento de mais de 1.200 indústrias têxteis de
pequeno e médio porte, com a redução de 500 mil empregos, e
a perda do mercado exportador de pluma de algodão, explicou
o ex-pesquisador da Embrapa. “Tivemos também a elevação
dramática dos volumes de pluma importados, que chegaram a
501,2 mil toneladas em 1993. O déficit comercial da cadeia
têxtil chegou a US$ 1,1 bilhão em 1997”, informou.
A partir de 1990 foi preciso definir novas estratégias para
garantir o mercado. Duas metas foram definidas e
trabalhadas: o algodão colorido no semi-árido do Nordeste e
o algodão em bases empresariais no cerrado do Centro-Oeste e
Nordeste.
As estratégias definidas para a implantação do algodão
colorido no semi-árido do Nordeste envolveram o
desenvolvimento de novas cultivares coloridas, a valorização
da produção artesanal, orgânica e familiar, o apoio a
pequenas indústrias locais, geração de moda própria,
consolidação da marca e marketing nacional e internacional e
a organização da cadeia produtiva.
Os resultados colhidos foram significativos e impulsionaram
a cotonicultura na região, como, por exemplo, o
desenvolvimento e a validação de um sistema de produção de
algodão colorido orgânico. A produção orgânica envolve hoje
seis municípios e 50 associações de produtores. Na safra de
2005, na Paraíba, a área plantada era de 4.600 hectares, com
a geração de 1.300 empregos diretos.
Outro resultado que apareceu foi o número de indústrias
têxteis e de confecção, que chegou a 25. Houve também dez
cooperativas e dez associações de artesãos, com 850 empregos
diretos, e 46 pontos de venda nas principais cidades do
Brasil e quatro no exterior.
O objetivo da implantação do algodão em bases empresarias no
cerrado do Centro-Oeste e Nordeste era a de adaptar a região
para a geração e transferência de tecnologia em parceria.
Uma das metas era o aproveitar a mecanização da soja para a
cultivar de algodão. Isso provocou algumas mudanças, como a
do perfil tecnológico do produtor de algodão, que passou a
ser especializado e de alto nível tecnológico. A formação de
um pool de produtores, para a aquisição de insumos,
comercialização de pluma, diretamente junto a indústria
têxtil e para exportação, foi outro investimento da
estratégia.
O resultado não poderia ser melhor, segundo Eleusio. O
investimento em geração e transferência de tecnologia chegou
a US$ 6,6 milhões/ano e a produtividade do algodão passou de
419 kg/ha para 2.906 kg/ha, o que representa um aumento de
693%. O sistema de produção sustentável no cerrado aumentou
em 17% de rentabilidade com o trio algodão-soja-milho. As
exportações anuais atingiram 390 mil toneladas de pluma ao
ano e o potencial de expansão para plantação foi de quatro
milhões de hectares.
Outro resultado desse investimento é em relação ao produtor.
“Ele ficou especialista em algodão, dominando inclusive
técnicas do mercado, como vendas e planejamento”,
acrescentou Eleusio. Também tem destaque a criação de fundos
e das associações, que aplicam a redução dos impostos em
pesquisa. “Hoje são 193 algodoeiros na região do Cerrado e o
Brasil é o quinto maior exportador de algodão”.
Algumas dificuldades foram superadas para que esse resultado
desse certo. Uma delas é a questão da colheita no cerrado,
que teve o custo da produção maior por conta de alguns
fatores como o uso de inseticidas e óleo diesel. Outras
dificuldades são o custo Brasil, que encarece US$ 200.00/ha,
e a dificuldade de acesso a cultivares transgênicas. Os
juros altos e o câmbio defasado estão reduzindo a
competitividade e lucratividade do agronegócio brasileiro.
No entanto, as perspectivas são atraentes, segundo o
especialista. A cadeia têxtil e de confecção oferta hoje
dois milhões de empregos e o planejado até 2008 é que os
postos de trabalho ampliem 350 mil novos empregos. O Brasil
tem condições de aumentar a área de produção em 30 a 50% e
o cerrado tem um grande potencial de expansão na
cotonicultura. Outra projeção é que em 2010 sejam plantados
dois milhões de hectares, abrangendo os Estados de Mato
Grosso, Bahia, Goiânia, Mato Grosso do Sul, São Paulo,
Paraná, Minas Gerais, Tocatins, Maranhão e Distrito Federal,
além do Nordeste.
Cana-de-açúcar
A cultura de cana-de-açúcar é uma
das mais antigas da história do país e os primeiros engenhos
surgiram em 1533, na Capitania de São Vicente, seguida de
Olinda em 1535. Com essa abordagem histórica, o pesquisador
da Embrapa Tabuleiros Costeiros (Aracaju/SE), Antônio Dias
Santiago, começou sua apresentação na tarde do dia 18. Ele
também comentou que as pesquisas realizadas pela Embrapa com
esta cultura ainda são recentes, porém de significativa
importância para o cenário de energia renovável.
Hoje, no Brasil, existem 306 usinas, que produzem 387
milhões de toneladas de cana-de-açúcar, o que torna o país o
maior produtor desta cultura com 5,4 milhões de hectares
plantados. São produzidos 26 milhões de toneladas de açúcar
e 16 milhões de metros cúbicos de álcool. O faturamento
chega a R$ 40 bilhões, representando 2,35% do PIB. As
exportações somam US$ 500 milhões e a geração de empregos
diretos é de um milhão. A produção está concentrada nas
regiões Nordeste, especialmente no litoral, e no centro Sul,
nos Estados de São Paulo, se expandindo para o Paraná.
O pesquisador comentou que as principais inovações políticas
que incentivaram o aumento da produção e da produtividade da
cana-de-açúcar no Brasil apareceram, com maior ênfase, a
partir da década de 70. Essas políticas eram comandadas pelo
Instituto do Açúcar e do Álcool (IAA) desde a sua criação,
em 1933. Incentivados pela alta do preço de açúcar na década
de 70 e contando com incentivos oficiais através do Programa
de Modernização da Agroindústria Canavieira, os empresários
do setor elevaram a capacidade de produção de 5,4 para 11,4
milhões de toneladas de açúcar por safra, com foco no
mercado externo.
Outro destaque feito por Santiago foi em relação ao Programa
Nacional do Álcool (Proálcool), que surgiu em 1975, com o
objetivo de incentivar a produção de álcool de qualquer
matéria-prima. “O cenário era propício para isso devido ao
preço do açúcar no mercado mundial e à crise que o petróleo
enfrentava”, disse ele. Os investimentos foram de US$ 7
bilhões na área agrícola e industrial.
Alguns fatores foram importantes no cenário do crescimento
da cultura de cana-de-açúcar. O preço do álcool, por
exemplo, sempre foi menor que o da gasolina e a redução de
impostos garantiu o álcool hidratado e a venda de carros.
Na área de inovações institucionais, Antônio destacou a
criação do Instituto do Açúcar e do Álcool (IAC), em 1887,
quando começaram as pesquisas em cana-de-açúcar: da Estação
Experimental de Cana-de-Açúcar, em 1966, pela iniciativa
privada; e da Planalsucar, em 1971. A Escola Superior de
Agricultura Luiz de Queiroz (Esalq) também teve papel
importante no desenvolvimento do setor. Outro destaque foi a
criação da Rede Interinstitucional de Desenvolvimento do
Setor Sucroalcooleiro. Por meio da iniciativa privada foram
criados os Centro de Tecnologia Coopersucar, em 1970, e o
Centro de Tecnologia Canavieira (CTC), em 2004.
No que diz respeito à questão de inovação tecnológica, o
pesquisador destacou o melhoramento, com novas variedades, e
o controle biológico, especialmente da cigarrinha e da
broca. Também lembrou dos ensaios de adubação, de calibração
de análises de solo e uso de corretivos; a fertirrigação,
com uso de vinhaça; o plantio mecanizado e a modernização do
sistema de carregamento e transporte da cana.
As inovações industriais envolveram o desenvolvimento de
motores automotivos e sistemas para o uso de etanol, o
pagamento pela qualidade da matéria-prima, aproveitamento do
bagaço e a automação. A extração do caldo, em cinco anos,
passou de 89% para 95%.
Antônio Santiago comentou que uma grande preocupação do
setor passou a ser o meio ambiente. “Muitos trabalhos estão
sendo feitos, como recuperação de matas ciliares, corredores
e reservas”, disse ele. O carro bi-combustível também é
outro reflexo positivo para o setor, assim como a
participação na indústria aeronáutica.
Para encerrar, o pesquisador disse que há grandes
expectativas para o setor de cana-de-açúcar, como a
estimativa de demanda potencial de álcool para adição à
gasolina. Como conclusão, ele afirmou que a implantação de
políticas públicas impulsionou a produção e produtividade da
cultura e a criação do Proálcool foi o marco da
transformação do setor. “O Brasil é vanguarda na geração de
energia e biomassa”, finalizou.
Florestas
O superintendente da Sociedade
Brasileira de Silvicultura, Rubens Garlipp, foi o terceiro
painelista da tarde do dia 18 e sua abordagem foi em relação
ao desenvolvimento das florestas cultivadas no Brasil. De
acordo com ele, até 1965 o país não tinha uma política
florestal e seguia o código florestal publicado em 1934.
Neste período, a área plantada era de 500 mil hectares. De
1965 a 1987 o período foi marcado pela criação da Política
para Reflorestamento, que possibilitou a criação do novo
Código Florestal, incentivos fiscais, criação do Instituto
Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (IBDF) no Ministério
da Agricultura, programas estratégicos e a Política Nacional
de Meio Ambiente.
O período de 1987 a 1990 foi marcado pela Política
Conservacionista e a revisão do Código Florestal. Já, nos
anos seguintes, até 1999, o destaque foi a desconexão
política ambiental e de reflorestamento. Depois, até 2005,
veio o Programa Nacional de Florestas (PNF), uma meta de
produção de 500 mil ha/ano e novas linhas de financiamento
para pequenos e médios produtores. Em 2005, a área plantada
era de 5,5 milhões de hectares.
Segundo Rubens, o cultivo de florestas exige uma visão de
longo prazo, uma vez o tempo para amadurecimento de algumas
espécies, como o eucalipto, é de seis a sete anos. “A
atividade de reflorestamento é um mecanismo de inclusão
social”, afirmou ele, complementando o que considera
importante observar neste cenário.
Os programas de investigação científica estabeleceram toda a
base de florestas plantadas no Brasil. Outros aspectos que
contribuíram com o desenvolvimento deste setor foram os
cursos de engenharia florestal, a formação de expertises, a
integração floresta e indústria, projetos industriais
considerados de classe mundial, os fóruns de debates e o
fomento florestal.
A participação do setor de silvicultura no PIB é de 2,9%, a
geração de empregos diretos é de 2,3 milhões e as
exportações geram US$ 4,7 bilhões. “São dados importantes e
que mostram como o setor está empenhado’, disse.
As vantagens competitivas do Brasil na silvicultura estão
relacionadas especialmente ao solo e ao clima favoráveis
para o cultivo de florestas, a disponibilidade de terra e a
organização da iniciativa privada. O conhecimento científico
e tecnológico, bem como a produtividade, também são
considerados pontos fortes do país.
Em relação às demandas, Rubens apresentou a divisão por
décadas, comentando que no início havia demandas e
incentivos, porém o conhecimento não estava acertado. Hoje,
o cenário é outro e o conhecimento tornou-se a base. As
demandas atuais exigem uma mecanização da colheita, o uso
múltiplo da madeira, um manejo sustentável, a geotecnologia,
o monitoramento de micro-bacias e muito mais.
Os avanços obtidos são inúmeros, como o banco de germoplasma
de Eucaliptus e Pinus e a redução de custos de produção.
Também figuram a produtividade industrial, a conservação da
biodiversidade, a diversificação de produtos, a silvicultura
de precisão e a eficiência competitiva e sustentabilidade.
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